segunda-feira, outubro 02, 2006

O que é (des)necessário

Às vezes é preciso se forçar a. A gente vive sem disciplina? Acho que nem sempre. Se a gente não se forçar a, não se vive. Ou vive-se sempre na expectativa do susto de ser pega de supresa. É preciso se forçar a fazer as coisas, mesmo sem tanta vontade. É preciso se forçar a acreditar naquilo em que não se crê mais. É preciso se forçar a dar um sorriso quando o que mais se quer é gritar. E também é preciso se forçar a dizer um não quando toda a capa de educação e gentileza e polidez e delicadeza aprisiona a gente dentro da gente. Às vezes é preciso se forçar a ser um pouco infeliz, só pra não se acostumar completamente com a alegria, e já prever o que virá num dia futuro. Ou que não virá. Mas é preciso se forçar a. Ainda que seja preciso se forçar a viver uma vida que você não escolheu para si. É preciso se forçar a ter alguma disciplina, a ordenar os livros na estante, a agendar os compromissos, a regular os horários. Às vezes é preciso se forçar a morrer um pouco. É preciso se forçar a neutralizar a brutalidade que há dentro da gente. Às vezes é preciso se forçar a não ser de todo bicho, e perder de vez todo o chão de terra humana que se pisa.

E tudo isso é tão difícil, pois entre a força que se faz pra dentro e pra fora da gente, nunca se sabe se excedemos - ou se fomos tão pouco. Às vezes é preciso se forçar a tentar, a se levantar da cama - por mais imersos que estejamos em nós mesmos. Às vezes é preciso se forçar a qualquer coisa, só pra perceber que não dá pra ser nunca dono de si mesmo, totalmente.

1 Comments:

At 4:59 PM, Anonymous Anônimo said...

Certíssima. Dentre todas as coisas, a mais difícil tem me parecido forçarmo-nos a sermos nós mesmos. Dizer 'não' quando é isso o que queremos dizer e dizendo 'sim' seríamos apenas gentis; forçarmo-nos a ficar em casa quando tudo o que desejávamos é sair à rua para fugir desse olhar-para-dentro; rever crenças, sentimentos, vontades... Enfim, drummondianamente, "pisar o chão do seu coração". :)

 

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"A linguagem é uma pele: fricciono minha linguagem contra o outro. Como se eu tivesse palavras à guisa de dedos, ou dedos na ponta de minhas palavras." (Roland Barthes)