quinta-feira, novembro 16, 2006

Do amanhecer e seus silêncios

Não agora, meu bem,
Que recai sobre mim o peso
da madrugada que se curva sob o sol.
Não agora, meu bem,
que o secreto amanhecer
se faz visível.
Oferece-me apenas teus dedos longos,
o cheiro dos cabelos noturnos.
Fica em silêncio e fecha os olhos,
sente o cheiro do dia que chega
sem pedir permissão.
Por ora, não.
Por ora quero o difícil prazer
do não sentir -
sentir-me quase nada,
sentir-me o mundo inteiro -,
sabendo-me vulgar e tola.
Sabendo-me qualquer um.
Por ora quero o canto estridente
dos pássaros que habitam os fios.
Por ora quero o gosto
do sono que chega,
cores sem sentido na montanha
que não conheço.
Por ora quero ouvir o mundo
dentro de mim, e inventar-lhe
qualquer outra irrealidade.
Não agora, meu bem,
que quero este momento
para sempre impresso
e revisitado:
silêncio de quem ressona,
pele morna, adocicada,
cheiro de quietude e proximidade,
ainda que distantes.
Cheiro de breve saudade.
Não agora, meu bem:
o mundo é grande,
e sempre escutarei
os incompreensíveis e ternos
murmúrios dos teus lábios
de amigo e amante.

3 Comments:

At 9:56 AM, Blogger devaneios said...

"Agora não, meu bem. que estou dentro de mim mesma, estou plena."
:)
bjs

 
At 11:45 AM, Anonymous Anônimo said...

Gostei, Su.

 
At 9:28 PM, Blogger r a c h e l said...

lindíssimo isso, arrepiei.
parabéns pelo poema parido.
e bom restinho de semana procê.

 

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"A linguagem é uma pele: fricciono minha linguagem contra o outro. Como se eu tivesse palavras à guisa de dedos, ou dedos na ponta de minhas palavras." (Roland Barthes)