sexta-feira, março 09, 2007

Entorpecente

Porque a vida é curta e, às vezes, fosca. Apesar do céu azul brilhante das tardes: há o cheiro pesado das semanas secas. Apesar de março. Apesar do verão.

Passam as horas sem razão alguma, enquanto o tempo parece estacionado no dia anterior - por vezes. A cada segundo transposto, o relógio balança sobre a mesa - vibra o momento que morre, vibra o momento que nasce. Curto.

Um sono, algum torpor. Há uma asfixiante falta de palavras. A voz rouca me mostra exaurida.

Passam as horas. Um cheiro de fumaça me deixa quase tonta. E, lá fora, as pessoas e os carros estão anoitecendo. Olho para o telefone, mas ele não toca. Procuro as pessoas, mas elas não estão.

E assim me arrasto, vagando. Até que chegue a noite e seu descanso, bem mais tarde. Até que chegue a hora em que o mundo vibre, noturnamente luminoso. Até que me venham as palavras acumuladas durante as horas mudas.

Pressiono contra a mesa bege o mosquito que me sugou um pouco do sangue, do ânimo. Pressiono meus lábios, prisão. E rompo o momento tenso dos segundos curtos ecoando na noite entorpecida. Abertos os olhos - o mundo continua o mesmo.

Eu que me ausentei.

2 Comments:

At 11:13 PM, Blogger Nelson said...

Nessa interminável repetição dos dias não há como não se ausentar, hora do mundo que lá fora espreita, hora de nós mesmos ansiosos pelo que jaz lá fora, mesmo sob o azul esplandescente, mesmo sob o signo do verão que ainda brada.

Acho que não estou mais aqui =/

 
At 9:26 AM, Anonymous Anônimo said...

Lindo! Vêm-me à lembrança as palavras de Gonzaguinha: "E é como se eu despertasse de um sonho que não me deixou viver..."

 

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"A linguagem é uma pele: fricciono minha linguagem contra o outro. Como se eu tivesse palavras à guisa de dedos, ou dedos na ponta de minhas palavras." (Roland Barthes)