Entorpecente
Porque a vida é curta e, às vezes, fosca. Apesar do céu azul brilhante das tardes: há o cheiro pesado das semanas secas. Apesar de março. Apesar do verão.Passam as horas sem razão alguma, enquanto o tempo parece estacionado no dia anterior - por vezes. A cada segundo transposto, o relógio balança sobre a mesa - vibra o momento que morre, vibra o momento que nasce. Curto.
Um sono, algum torpor. Há uma asfixiante falta de palavras. A voz rouca me mostra exaurida.
Passam as horas. Um cheiro de fumaça me deixa quase tonta. E, lá fora, as pessoas e os carros estão anoitecendo. Olho para o telefone, mas ele não toca. Procuro as pessoas, mas elas não estão.
E assim me arrasto, vagando. Até que chegue a noite e seu descanso, bem mais tarde. Até que chegue a hora em que o mundo vibre, noturnamente luminoso. Até que me venham as palavras acumuladas durante as horas mudas.
Pressiono contra a mesa bege o mosquito que me sugou um pouco do sangue, do ânimo. Pressiono meus lábios, prisão. E rompo o momento tenso dos segundos curtos ecoando na noite entorpecida. Abertos os olhos - o mundo continua o mesmo.
Eu que me ausentei.
2 Comments:
Nessa interminável repetição dos dias não há como não se ausentar, hora do mundo que lá fora espreita, hora de nós mesmos ansiosos pelo que jaz lá fora, mesmo sob o azul esplandescente, mesmo sob o signo do verão que ainda brada.
Acho que não estou mais aqui =/
Lindo! Vêm-me à lembrança as palavras de Gonzaguinha: "E é como se eu despertasse de um sonho que não me deixou viver..."
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