terça-feira, setembro 05, 2006

Da ausência da primavera

É a terceira segunda-feira consecutiva de chuva, neblina e frio. Ao menos, depois de uns meses de seca, a água já vem com certa intensidade, e acordo ao som das pequenas corredeiras no caminho ao lado de minha janela. A paisagem se despiria de branco, se um véu não cobrisse tudo ao redor. Pode ser bonito, pode lembrar o tal fog londrino - mas sei é que me faz espirrar.

O inverno ainda está aqui, cobrindo-me de lã da cabeça aos pés. A lua cheia está para chegar, mas permanecerá anônima por trás das nuvens. Coisas de lua cheia. Mas, há poucos dias - ou há poucas noites -, havia uma lua crescente, amarela, sorrindo de frente pra mim. Não prata, mas ouro no céu. Sem a poeira molhada que insiste em tudo esconder.

Faz frio. Busco os termômetros só para poder documentar essa esquisita mania que as pessoas têm de achar o frio chique. Busco os termômetros, tentando aumentar em mim a sensação do vento cortando os lábios. Masoquismo? Porém, na maioria das vezes, não concordo com os numerozinhos luminosos.

Já é setembro e a primavera está por vir, embora mal se anuncie. Talvez porque dormindo ao som da chuva miúda... Mas quero estar na praça quando se colorirem as copas das árvores, e aquela paineira se encher de flor. Mas, por favor, que não seja numa segunda-feira.

"A linguagem é uma pele: fricciono minha linguagem contra o outro. Como se eu tivesse palavras à guisa de dedos, ou dedos na ponta de minhas palavras." (Roland Barthes)