segunda-feira, abril 02, 2007

Excessivamente

De repente, vêm as palavras em profusão. Claras e várias, sonoras e intensas. Não, agora não é nenhuma tentativa de literatice. É meio que um desabafo, mesmo, embora não chegue aos ouvidos - ou aos olhos - do destinatário. Fica como terapia, e mais nada.

É bom viver a vida sem pensar muito no preço das coisas, embora a gente saiba que não se consegue muita coisa sem dinheiro algum. De toda forma, as árvores floriram num março ensolarado - e de graça. A capela no alto da montanha estava lá para quem fosse visitá-la, e não havia bilhete de entrada. As nuvens se enfiaram na frente do sol só para fazer um entardecer mais bonito. E há pessoas que ainda passam os sábados e domingos e madrugadas e chuvas e sóis na frente do computador. Devorando livros - nada contra, por favor, mas é que tudo em excesso faz algum mal. Ah! E livros acadêmicos, nada do prazer da literatura, essa viagem. Livros acadêmicos ou sobre queijos. Não, nada charmoso, nada associável a vinhos: livros que falam sobre mexer em queijo. Enquanto isso, adiam eternamente o momento em que se defrontarão consigo mesmos num conto do Machado de Assis. "O espelho", por exemplo. "Teoria do medalhão", outro. "O enfermeiro", que também é indispensável.

E a vida se fazendo nos intervalos. Nos intervalos do trabalho, na pausa para o café. As palavras não-oficiais. Os fins de semana. Os sábados e domingos ligeiros, plenos de brisas. Meu primo me chamando de Nana, aprendendo a contar sem ter a idéia de quanto sejam quatro formigas. Meu outro primo sorrindo em sua festa de aniversário. O presente de madeira, baratinho, para ser todo aproveitado pelo bebê de um ano. Sem grandes sofisticações, sem grandes exigências. Porque a vida, essa dos intervalos, geralmente não cobra nada da gente.

Um lado excessivamente humano que descobri em mim também me dói: eu, às vezes, odeio. E isso me dói porque isso significa que sou pior do que supunha, e que determinada situação me afeta muito mais do que gostaria - embora faça uma força para provar o contrário. Mas sei que me esqueço com relativa rapidez das coisas. Sei que daqui a semanas, meses, anos, todas essas situações serão só esboços descartados de uma obra ainda em composição. Que é a vida, a dos intervalos.

E como sou feliz nos intervalos. Mesmo quando nada de importante parece acontecer. Mesmo quando só há o silêncio ou o azul ou o branco. Mesmo quando fecho os olhos aos poucos e começo a sonhar qualquer coisa de que não me lembrarei depois. Mesmo, ou principalmente. Como quando acordo cedinho e vejo que ainda posso ficar na cama. Ou como quando o filme está apenas começando e eu já gostei dele. Ou quando eu escuto qualquer palavra baixinho, perto do ouvido. Ou como quando estou com meus primos pequenos, fazendo toda sorte de palhaçada para eles riam por horas seguidas, uma risada gostosa de dentinhos separados. Ou como quando cheiro seus cabelos loiros ou castanhos, lisos ou encaracolados.

E, assim, descubro que certa está minha amiga Rachel: escrever é uma terapia. E saio mais leve depois de ter botado uns demônios pra fora, ainda que meio sem nexo. É que às vezes a gente precisa disso. Nós, essa gente excessivamente humana.

3 Comments:

At 7:55 AM, Blogger caeiro said...

estava conversando com um amigo querido ontem, concidências, e estávamos falando exatamente (também)sobre isso. falávamos porém, com outras palavras, que a vida se desfaz nos intervalos. sermos nós mesmo s nos intervalos, nessa nossa conversa de ontem, é como aceitar esmolas. por favor, não me leve a mal e nem pense nisso como uma crítica negativa. mas estou aqui a fazer terapia também. à propósito: muito bacana teu relato.

 
At 2:24 AM, Blogger Rodrigo Romeiro said...

Eu poderia estar aqui roubando, vendendo balas em sinais de trânsito, pedindo... Não pertenço a nenhum plano mega literário pra impressionar o page hack do google e angariar alfaias anônimas... Não tenho nada mesmo a linkar ao teu blog... MAS TENHO BOM GOSTO E TE ADORO, TEODORA! Ops... isso era pra estar em outro lugar!Rssss ADORO LER-TE!!! Por isso, Su, continue a fazer tuas terapias que nós, pessoa excessivamente humanas, agradecemos! Só espero que alguém continue ignorante às tuas palavras... senão elas deixarão de ter sentido! Rssss [... É meio que um desabafo, mesmo, embora não chegue aos ouvidos - ou aos olhos - do destinatário. Fica como terapia, e mais nada.] Rssss... "E A IGNORÂNCIA DE UNS, SALVARÁ O MUNDO!" [By provérbio inventado agora por uma mente desocupada!] Rsssss....
Bjos.

 
At 10:27 AM, Blogger Pereira said...

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"A linguagem é uma pele: fricciono minha linguagem contra o outro. Como se eu tivesse palavras à guisa de dedos, ou dedos na ponta de minhas palavras." (Roland Barthes)