quinta-feira, novembro 22, 2007

Fragmentos de um discurso pós-quase-amor

- Eu não sei bem o que quero agora.

- Eu também não.

- Mas antes eu sabia.

- ...

- Eu sabia que um dia isto ia acabar.

- Eu também. Mas não sabia quando.

- Não sabia que seria agora.

- Não sabia que seria assim.

- Não sabia que seria sem dor.

- Mas não dói para você?

- ...

- Não?

- É. Dói. Mas não dói tanto quanto eu imaginava.

- Mentira.

- Dói. Dói sim. Dói um pouquinho a dor...

- ?

- ... a dor de não sentir nada.

- ...

- Ou quase nada.

- Então não dói?

- Não.

- ...

- E é isso o que mais dói: depois de tudo isso, eu acabei descobrindo que o que eu quero, mesmo, é a dor.

- É. Eu também.

segunda-feira, novembro 12, 2007

À janela

Não sei o que há. Mas a chuva me enche de tal melancolia que silencio toda. Não é o vento, não é o frio que a acompanha os pingos, não é o molhar-se quando fora de casa. Talvez seja o escorrer pelos muros e telhados. Talvez seja o alto dos eucaliptos escondido por finas névoas. Talvez seja o jogar-se contra o chão sem pressa ou susto. E ver a chuva chovendo das folhas, das flores no jardim, das calhas imperfeitas. O transbordar dos buracos nas ruas escorregadias.

Não sei o que há. Mas chove, e eu toda silencio. Não há lugar para alegria – o que não significa que me tome a tristeza. Há o silêncio, há o branco, há a espera. Talvez seja chovendo que, solitária, encontro-me. Sem o barulho das crianças brincando. Sem o imperioso chamado do céu azul para vida, a vida. Chove, e a vida é úmida, constante, invadindo o seco das tardes. Chove, e a chuva molha mesmo quem dela se protege.

"A linguagem é uma pele: fricciono minha linguagem contra o outro. Como se eu tivesse palavras à guisa de dedos, ou dedos na ponta de minhas palavras." (Roland Barthes)